Análise do posicionamento do Grão-Ducado do Luxemburgo frente ao Capítulo de Comércio e Desenvolvimento Sustentável (TSD) do Acordo de Associação UE-Mercosul

Davi Phelipe Marcelino Farias*

Desde a sua consolidação como Estado soberano em 1839, o Grão-Ducado do Luxemburgo, sob a estrutura de uma monarquia constitucional e parlamentar, tem demonstrado um compromisso contínuo com o fortalecimento democrático e a integração europeia. Enquanto Estado-membro fundador da União Europeia, Luxemburgo desempenha papel central no processo de integração europeia, participando da zona do euro e do espaço Schengen, além de sediar instituições europeias em sua capital. Economicamente, o Grão-Ducado mantém a maior taxa de Produto Interno Bruto per capita da União Europeia, sustentado por uma economia sólida, de baixa inflação e desemprego, fortemente interligada ao mercado interno europeu [1].

A economia luxemburguesa é amplamente baseada no setor de serviços, responsável por mais de 80% do PIB, com especial ênfase em atividades financeiras, tecnologia da informação, telecomunicações e logística [2]. A indústria, embora menos representativa, mantém papel importante em áreas como metalurgia e produtos químicos, enquanto a agricultura representa menos de 1% do PIB.

No que se refere às relações econômicas com o Mercosul, o intercâmbio comercial permanece limitado, representando parcela inferior a 0,5% do total de exportações de bens (€79,47 milhões, 2024), e menos de 1% das importações dessa mesma categoria (€119 milhões, 2017), havendo uma balança comercial deficitária para o Grão-Ducado do Luxemburgo. Entretanto, as exportações de serviços de Luxemburgo ao Mercosul atingiram €458 milhões em 2023 [3]. Os principais fluxos concentram-se em serviços financeiros, equipamentos industriais e derivados de petróleo. Assim, a baixa intensidade da balança comercial revela baixa vulnerabilidade econômica ao Acordo de Associação UE-Mercosul, o que confere ao Grão-Ducado margem de flexibilidade para apoiar a intensificação das relações econômicas birregionais.

As trocas comerciais com o Mercosul são marcadas pela predominância dos serviços, em especial nas áreas financeira, de telecomunicações e de transporte. O acordo em discussão apresenta potencial para ampliar o acesso a esses setores, além de reduzir tarifas incidentes sobre bens industriais relevantes para a economia luxemburguesa, como máquinas, plásticos, ferro e aço, fortalecendo a competitividade de nossas exportações.

No entanto, a agricultura luxemburguesa permanece particularmente sensível diante da concorrência do setor agrícola do Mercosul [4]. Por essa razão, Luxemburgo considera fundamentais as disposições do Acordo de Associação UE-Mercosul que preveem cotas de importação e cláusulas de salvaguarda, garantindo proteção aos agricultores nacionais contra desequilíbrios súbitos no mercado e a produtos relacionados a Indicações Geográficas (GIs).

O governo do Grão-Ducado do Luxemburgo apoia a versão final do Acordo de Associação UE-Mercosul apresentada pela Comissão Europeia no dia 3 de setembro de 2025, entendendo que o acordo fortalece a capacidade da União Europeia de estabelecer parcerias estratégicas frente às mudanças comerciais globais e traz efeitos positivos para setores industriais relevantes, ao mesmo tempo em que protege os interesses luxemburgueses e europeus, notadamente do setor agroalimentar, através de suas cláusulas e salvaguardas. Essas medidas são essenciais para assegurar que a liberalização comercial não comprometa a competitividade dos produtores nacionais.

Além disso, o governo também aponta a necessidade de que a implementação do Acordo de Associação UE-Mercosul seja compatível com os padrões sanitários e ambientais europeus, em estrita observância aos compromissos internacionais sobre clima e desmatamento, em particular no que diz respeito à preservação da Amazônia.

Embora se reconheça a existência de diferentes sensibilidades no debate político, o Governo luxemburguês mantém posição de apoio ao acordo, considerando-o benéfico à economia e compatível com os valores ambientais da União Europeia [5].

No plano político interno, observa-se que a base governista mantém posição majoritariamente favorável, enquanto a oposição se mostra crítica, sobretudo aos possíveis impactos ambientais, com destaque para o desmatamento da Amazônia. O Partido Operário Socialista do Luxemburgo (LSAP) enfatiza a necessidade de proteger agricultores e consumidores, ao passo que o Partido Reformista da Alternativa Democrática (ADR) levanta preocupações quanto a práticas de concorrência desleal [6]. Apesar dessas divergências, a ampla maioria parlamentar da coalizão governista garante a manutenção de uma linha de apoio ao acordo.

No Parlamento Europeu, os representantes luxemburgueses refletem a diversidade de posições presentes no debate europeu. O Partido Popular Europeu, que inclui dois eurodeputados luxemburgueses, tende a apoiar o acordo [7], destacando a necessidade de diversificação comercial da União Europeia diante das mudanças nas dinâmicas globais, ao mesmo tempo em que ressalta a importância de preservar os padrões sanitários, ambientais e a proteção aos agricultores. Eurodeputados do grupo Renew Europe, ao qual integra eurodeputado luxemburguês, recentemente manifestaram-se favoráveis à ratificação do acordo [8]. Em contraste, o grupo dos Verdes, ao qual faz parte eurodeputada luxemburguesa, mantém posição crítica, principalmente em função dos riscos ambientais associados ao desmatamento. Quanto aos demais eurodeputados do Luxemburgo, nem todos se manifestaram publicamente de forma explícita, mas, em geral, seguem a posição de seus respectivos grupos no Parlamento Europeu.

Observa-se também que, no âmbito da sociedade civil, também se registram diferentes percepções acerca do Acordo de Associação UE-Mercosul. A Federação de Negócios de Luxemburgo (FEDIL), representando a indústria e o comércio, manifestou apoio ao acordo UE–Mercosul, destacando sua relevância estratégica para a economia luxemburguesa e europeia [9]. O FEDIL salientou que o pacto contribui para a competitividade e presença internacional das empresas, facilita o acesso a matérias-primas essenciais, apoia pequenas e médias empresas e amplia oportunidades comerciais em um mercado de 750 milhões de consumidores. A federação enfatiza a importância de uma ratificação célere do acordo, visando maior autonomia econômica, sustentabilidade e competitividade. Em contrapartida, as organizações Mouvement Écologique [10] e Greenpeace [11] manifestaram-se contrárias ao acordo UE–Mercosul, destacando potenciais impactos negativos significativos. Segundo essas entidades, o pacto poderia intensificar a exploração agrícola, pressionar as pequenas e médias explorações familiares, manter o desmatamento na Amazônia e comprometer os compromissos climáticos da UE. As organizações também alertam para riscos à biodiversidade, à segurança alimentar e aos direitos de povos indígenas e comunidades locais, bem como para possíveis efeitos adversos sobre a regulamentação ambiental e social europeia.

Referências
[1] CENTRAL INTELLIGENCE AGENCY (CIA). Luxembourg – The World Factbook. https://www.cia.gov/the-world-factbook/countries/luxembourg/#economy.
[2] Moody’s Analytics. Luxembourg | Economic Indicators. https://www.economy.com/luxembourg/indicators.
[3] OBSERVATORY OF ECONOMIC COMPLEXITY (OEC). Luxembourg – Exports, Imports, and Trade Partners. https://oec.world/en/profile/country/lux?selector343id=Import&selector1879id=percentage&selector345id=2023&selector359id=HS4&selector401id=Treemap.
[4] Business & Human Rights Resource Centre. EU Mercosur deal worries luxembourgs farmers and environmental groups. 18 de maio de 2025. https://www.business-humanrights.org/en/latest-news/eu-mercosur-deal-worries-luxembourgs-farmers-and-environmental-groups/.
[5] Chambre des Deputes du Grand-Duche de Luxembourg. Quelle est la position du Luxembourg sur l’accord UE-Mercosur ?. 27 de fevereiro de 2025. https://www.chd.lu/fr/position-luxembourg-accord-UE-Mercosur.
[6] ADR – DEMOKRATESCH REFORMPARTEI. Keng onfair Wettbewerbsbedéngungen duerch de Mercosur!. https://adr.lu/keng-onfair-wettbewerbsbedengungen-duerch-de-mercosur/.
[7] DW News. UE dá passo importante para conclusão de acordo com Mercosul. 3 de setembro de 2025. https://www.dw.com/pt-br/ue-d%C3%A1-passo-importante-para-conclus%C3%A3o-de-acordo-com-mercosul/a-73872047.
[8] Renew Europe Group. EU-Mercosur Partnership Agreement: Renew Europe MEPs welcome the start of the formal ratification process. 3 set. 2025. https://www.reneweuropegroup.eu/news/2025-09-03/eu-mercosur-partnership-agreement-renew-europe-meps-welcome-the-start-of-the-formal-ratification-process.
[9] Chambre de Commerce Luxembourg. La FEDIL salue l’accord commercial UE–Mercosur comme une opportunité stratégique pour le Luxembourg et pour l’Europe. 28 agosto de 2025. https://www.cc.lu/toute-linformation/actualites/detail/la-fedil-salue-laccord-commercial-ue-mercosur-comme-une-opportunite-strategique-pour-le-luxembourg-et-pour-leurope.
[10] Mouvement Ecologique. Stopp des schädlichen Freihandelsabkommens zwischen der Europäischen Union und den Mercosur-Staaten. 9 julho de 2025. https://www.meco.lu/fr/blog/documentcenter/stopp-des-schaedlichen-freihandelsabkommens-zwischen-der-europaeischen-union-und-den-mercosur-staaten/.
[11] Greenpeace Luxembourg. Accord UE-Mercosur: Greenpeace s’insurge face au discours du Premier ministre Luc Frieden. 14 de maio de 2025. https://www.greenpeace.org/luxembourg/fr/communiques-de-presse/24483/accord-ue-mercosur-greenpeace-sinsurge-face-au-discours-du-premier-ministre-luc-frieden/.

*Davi Phelipe Marcelino Farias
Graduando em Relações Internacionais na Universidade Positivo. Lattes: 5924962048450789. ORCID: 0009-0001-2375-592X