Análise do posicionamento de Malta frente ao Capítulo de Comércio e Desenvolvimento Sustentável (TSD) do Acordo de Associação UE-Mercosul

Lucas Gabriel de Andrade Melo*

A República de Malta, menor país da União Europeia, localiza-se no centro do mediterrâneo e está a apenas 93 km ao sul da Sicília e 288 km ao norte da África. Por conta de sua condição geográfica privilegiada, Malta representa um eixo de comércio marítimo e transbordo com todo o Norte da África, Oriente Médio e Ásia, além de se projetar como um ponto estratégico de captação de investimento de empresas sul-americanas no mercado europeu [1]. Malta entrou na União Europeia no ano de 2004, desde então adotou uma postura cooperativa dentro da UE sendo historicamente uma nação que seguiu a lógica do europeísmo [2]. Comprometeu-se imediatamente a aderir à zona de Schengen em 2007, e o euro em 2008, algo que foi visto positivamente pela estabilidade monetária que representava e pelo impacto potencial na atração de investimento estrangeiro[2].

Malta é um país de alta renda e sua economia é impulsionada pela inovação [3]. O crescimento do PIB nacional foi de 6,0% em 2024 e está previsto para manter um crescimento de 4% em 2025. Ocupa a décima posição na União Europeia em termos de PIB per capita, com €39.500, valor bem acima da média da UE (€37.600) e representa 0,1% do PIB total da União Europeia. [4]. Os principais setores que impulsionam a economia maltesa são; o setor terciário, que representa aproximadamente 80,6% de seu PIB; o setor industrial, que corresponde a 11,7%; o setor manufatureiro, que representa 6% e o setor agrícola, que corresponde a 0,7% da participação do PIB aproximadamente [5]. A economia de Malta é majoritariamente voltada para o setor terciário, o que faz sua exposição a setores sensíveis, especialmente o agroalimentar, no âmbito do acordo com o Mercosul relativamente baixa [5].

O comércio é particularmente importante para Malta, a estimativa da Comissão Europeia é de que 1 a cada 5 empregos em Malta se deve ao comércio do país e da União Europeia com o mundo [6]. O acordo de associação UE-Mercosul pode mudar a configuração de países e a quantidade de bens e serviços os quais Malta importa e exporta; atualmente a porcentagem de importações totais de Malta com países fora da União Europeia em 2024 foi de 35%, já as exportações foram 50% [8]. Por ser um país insular, Malta tem dificuldades em levar seus produtos para mercados além da União Europeia, tanto pela dificuldade de produzir em escala causada pela limitação territorial e limitação de recursos naturais, quanto pelos custos elevados de transporte [7].

Para Malta, a implementação do acordo UE–Mercosul seria uma oportunidade de diversificar suas relações econômicas para além do eixo europeu, ao mesmo tempo em que contribui para o fortalecimento do mercado europeu como um todo, além de uma solução para os desafios de insularidade. O acordo de associação UE-Mercosul pode mudar a configuração de países e a quantidade de bens e serviços os quais Malta importa e exporta; atualmente a porcentagem de importações totais de Malta com países fora da União Europeia em 2024 foi de 35%, já as exportações foram 50% [8]. Malta exporta para o Mercosul principalmente papel; plástico; produtos manufaturados; máquinas; instrumentos ópticos; médico-cirúrgicos; de medição e fotográficos e importa açúcar; artigos de confeitaria; bebidas; destilados; madeira; cereais; maquinário; equipamentos de transporte; produtos químicos e combustíveis minerais [8].

Outra expectativa que o acordo promete é que o Mercosul se aproxime mais próximo dos 10 maiores parceiros comerciais de Malta; O Mercosul atualmente é o 24º maior parceiro comercial de Malta fora da União Europeia e o comércio total entre Malta e o Mercosul de bens (2024) e serviços (2023) foi de 94 milhões de euros. [9] O Acordo de Associação União Europeia – Mercosul significa que as pequenas e médias empresas maltesas vão ter maior facilidade de acessar o mercado do Mercosul, os serviços que Malta oferece vão conseguir ser ofertados com um valor mais acessível e com menor burocracia e os produtores de alimentos e bens industriais vão conseguir exportar mais [10]. Além da eliminação progressiva de barreiras tarifárias que atualmente chegam a até 55% para produtos agroalimentares do bloco europeu [10], outro efeito positivo amplamente esperado do Acordo UE-Mercosul, especialmente no contexto de Malta, diz respeito à dinamização econômica interna. A abertura do mercado transatlântico tende não apenas a facilitar o acesso a uma maior variedade de produtos latino-americanos a preços mais competitivos — como alimentos, matérias-primas e bens manufaturados — mas também a estimular setores estratégicos da economia maltesa, particularmente os serviços de telecomunicação, transporte, I-gaming, turismo e hotelaria. Esse aumento na atividade econômica poderá refletir-se na criação de novos postos de trabalho [10], tanto diretos quanto indiretos, impulsionando o emprego e promovendo uma maior integração de Malta às cadeias globais de valor. Em suma, espera-se que o acordo contribua para o crescimento econômico maltes, através da geração de empregos e diversificação econômica.

O governo de Malta tem se posicionado de forma favorável à conclusão do Acordo de Associação entre a União Europeia e o Mercosul, reconhecendo nele um instrumento estratégico para o fortalecimento das relações econômicas e políticas entre os dois blocos. [11] As autoridades maltesas veem no acordo uma oportunidade concreta de promover o crescimento econômico sustentável, ampliar o acesso a novos mercados e estimular a criação de empregos. O Ministro das Relações Exteriores, Ian Borg, tem reiterado em diversos fóruns internacionais a importância de acelerar a conclusão dos acordos comerciais ainda pendentes da União Europeia, incluindo o do Mercosul. Em suas declarações, Borg tem enfatizado que tais acordos representam não apenas uma expansão das oportunidades comerciais, mas também um reforço da posição global da União Europeia como defensora do multilateralismo, do comércio aberto e de parcerias baseadas em regras e valores comuns [3]. Embora não haja registros de pronunciamentos específicos ou de participação destacada dos eurodeputados malteses em votações ou relatórios diretamente relacionados ao Acordo UE–Mercosul, a orientação geral da política externa maltesa é de apoio a iniciativas de liberalização comercial e de integração econômica. Essa posição é coerente com a postura de abertura e cooperação internacional que caracteriza a diplomacia do país. [3] A Presidenta da República, Myriam Spiteri Debono, também manifestou publicamente seu respaldo à conclusão do acordo, ressaltando em diversas ocasiões o potencial transformador que ele representa tanto para a União Europeia quanto para os países do Mercosul. Debono tem salientado que, em um cenário global cada vez mais interdependente, acordos dessa natureza são fundamentais para promover o desenvolvimento sustentável, o crescimento inclusivo e a estabilidade das relações internacionais [12].

Em suma, a implementação do Acordo UE–Mercosul apresenta-se como uma oportunidade estratégica para o fortalecimento da economia maltesa e para o aprofundamento de sua integração nos fluxos globais de comércio. A remoção gradual das tarifas alfandegárias e a adoção de medidas de facilitação do comércio poderão tornar os produtos e serviços malteses mais acessíveis e competitivos nos mercados sul-americanos, ampliando as exportações e reforçando a presença de Malta no espaço econômico transatlântico[10]. Ao mesmo tempo, o acordo deverá gerar um ambiente mais dinâmico para o setor terciário maltês, que poderá se beneficiar tanto do aumento do fluxo de investimentos quanto da expansão das parcerias com empresas e instituições do Mercosul. Áreas como turismo, construção civil, hotelaria, alimentação, I-gaming, transportes e educação tendem a experimentar crescimento, impulsionadas por novos investimentos e pela intensificação das relações econômicas entre os dois blocos [13].

Além disso, o potencial de geração de empregos é um dos aspectos mais promissores do acordo. A expansão das exportações maltesas e o aumento da presença de empresas oriundas do Mercosul no país poderão criar novas oportunidades de trabalho, não apenas em setores tradicionais, mas também em áreas de serviços especializados e inovação tecnológica. Dessa forma, o acordo poderá contribuir para o desenvolvimento socioeconômico de Malta, promovendo um crescimento mais diversificado e resiliente [10].

Contudo, é essencial reconhecer que essa abertura comercial também traz desafios consideráveis. A maior exposição das empresas maltesas à concorrência internacional poderá pressionar especialmente as pequenas e médias empresas, que já enfrentam dificuldades relacionadas à escala de produção e aos custos adicionais decorrentes da condição insular do país [14]. Há também o risco de que a liberalização comercial resulte em uma competição desigual, caso as indústrias locais não consigam adaptar-se com rapidez às novas exigências do mercado [14].

Outro ponto de atenção é o potencial impacto ambiental decorrente do crescimento das trocas comerciais e do aumento da atividade econômica [15]. A expansão do comércio marítimo, o aumento da demanda por infraestrutura e a intensificação do turismo podem gerar pressões adicionais sobre os recursos naturais e os ecossistemas locais. Por isso, será fundamental que a implementação do acordo venha acompanhada de políticas de sustentabilidade e de mecanismos eficazes de monitoramento ambiental, em consonância com os compromissos da União Europeia e de Malta em matéria de desenvolvimento sustentável [15].

Em última análise, o Acordo UE–Mercosul representa, para Malta, tanto uma oportunidade de crescimento econômico e modernização quanto um teste à sua capacidade de equilibrar competitividade, sustentabilidade e coesão social. O sucesso dessa integração dependerá da adoção de políticas públicas que assegurem que os benefícios da liberalização comercial sejam amplamente distribuídos e que os desafios associados sejam enfrentados de maneira responsável e estratégica.

Referências
[1] E&S Group. 2024. “Analyzing Malta’s Strategic Position in the Mediterranean and Its Influence on Trade Routes and Business Partnerships.” Acesso em 30 ago. 2025. https://www.ellulschranz.com/malta-influence-business-partnerships.
[2] Harwood, Mark. Malta in the European Union. Farnham: Ashgate, 2014.
[3] Malta. Malta’s Foreign Policy Strategy: Strategic Framework 2022–2023. Valletta: Ministry for Foreign and European Affairs, 2022.
[4] European Commission, Directorate-General for Economic and Financial Affairs. “Economic Forecast for Malta.” Acesso em 9 out. 2025. https://economy-finance.ec.europa.eu/economic-surveillance-eu-economies/malta/economic-forecast-malta_en.
[5] Lloyd’s Bank Trade. “The Economic Context of Malta.” International Trade Portal. Última atualização em set. 2025. Acesso em 8 out. 2025. https://www.lloydsbanktrade.com/en/market-potential/malta/economical-context.
[6] European Commission – Directorate-General for Trade and Economic Security. “Factsheet: EU-Mercosur Partnership Agreement – Opening a Wealth of Opportunities for People in Malta.” Acesso em 8 out. 2025. https://policy.trade.ec.europa.eu/eu-trade-relationships-country-and-region/countries-and-regions/mercosur/eu-mercosur-agreement/factsheet-eu-mercosur-partnership-agreement-malta_en.
[7] McClung, Sean. 2023. “The Challenges Faced by Small Island Economies.” INOMICS (blog), 15 ago. 2023. Acesso em 9 out. 2025. https://inomics.com/blog/the-challenges-faced-by-small-island-economies-1538338.
[8] Trading Economics. “Malta — Indicators.” Acesso em 8 out. 2025. https://tradingeconomics.com/malta/indicators.
[9] European Commission. “EU-Mercosur – A Boost for Jobs and Exports in Malta.” Policy & Trade (European Commission). Acesso em 9 out. 2025. https://policy.trade.ec.europa.eu/eu-trade-relationships-country-and-region/countries-and-regions/mercosur/eu-mercosur-agreement/eu-mercosur-boost-jobs-and-exports-malta_en.
[10] European Commission. “EU Trade Relationships by Country/Region.” Policy & Trade (European Commission). Acesso em 9 out. 2025. https://policy.trade.ec.europa.eu/eu-trade-relationships-country-and-region_en.
[11] Ministry of Foreign Affairs of Brazil. “Visit to Brazil of the Minister of Foreign, and European Affairs and Trade of the Republic of Malta, Ian Borg.” Acesso em 9 out. 2025. https://www.gov.br/mre/en/press-releases/visit-to-brazil-of-the-minister-of-foreign-and-european-affairs-and-trade-of-the-republic-of-malta-ian-borg.
[12] Rising Malta. “Ambassador of the Federative Republic of Brazil Renato Mosca de Souza Presented His Letters of Credence to President Myriam Spiteri Debono at the Presidential Palace, Acesso em 9 out. 2025. https://risingmalta.com/ambassador-renato-mosca-de-souza-letters-of-credence-valletta.
[13] Banco de España. “Acordo Comercial UE-Mercosul e seu Impacto nas Economias Europeias.” Acesso em 9 out. 2025. https://www.bde.es/f/webbde/SES/Secciones/Publicaciones/InformesBoletinesRevistas/BoletinEconomico/19/T3/Fich/be1903-art5.pdf.
[14] Van Cutsem, Gaspar. 2025. “Mercosur, Again but What About Malta?” Acesso em 9 out. 2025. https://thegreenhand.eu/mercosur-again-but-what-about-malta.
[15] Meloni, Silvia. 2025. “O Acordo UE-Mercosul Apresenta Implicações Ambientais e Sociais Sérias.” Earth.Org, Acesso em 9 out. 2025. https://earth.org/pt/o-acordo-ue-mercosul-implicacoes-ambientais-sociais

*Lucas Gabriel de Andrade Melo
Graduando em Relações Internacionais pela Universidade Estadual da Paraíba – UEPB. ORCID: 0009-0004-0506-5310.