Observatory on European Studies _ União Europeia passa a proibir a comercialização de produtos de plástico de utilização única
Aline Beltrame de Moura *
A partir de 3 de julho de 2021 passaram a valer as disposições previstas na Diretiva (UE) n. 2019/904 relativa à redução do impacto de determinados produtos de plástico no ambiente, cujo objetivo é proibir o comércio de certos produtos de plástico de utilização única para os quais existem alternativas, como pratos, talheres, cotonetes, balões, recipientes para alimentos e bebidas que sejam fabricados com poliestireno expandido e plástico oxodegradável.
A Diretiva, aprovada em 2019, se alinha aos propósitos da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, adotada pela Assembleia Geral da ONU em 25 de setembro de 2015, em particular, com a concretização dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS’s) n. 12 que visa garantir padrões de consumo e de produção sustentáveis e n. 14 sobre a conservação e a utilização de forma sustentável dos oceanos, mares e recursos marinhos, uma vez que a questão do lixo marinho é transfronteiriça e apresenta-se como um problema mundial crescente.
Um recente estudo publicado na revista científica Nature Sustainability[1] revelou que 80% do lixo encontrado nos oceanos é composto por plástico, sobretudo sacolas, garrafas e recipientes para alimentos que, devido aos ventos e às ondas, acabam se concentrando de modo predominante nas faixas costeiras e no fundo do mar perto das costas.
Na União Europeia, a Comissão alerta que os artigos de plástico de utilização única representam 50% do volume total encontrado nos mares e os artigos relacionados com a pesca totalizam 27% dos resíduos plásticos[2].
A preocupação da comunidade científica com o modelo econômico conhecido por “produzir-usar-descartar” justifica-se na medida em que se estima existir mais de 150 milhões de toneladas de plástico atualmente nos oceanos[3]. Um estudo da Fundação Ellen MacArthur em parceria com o Fórum Econômico Mundial e McKinsey & Company, publicado em 2016, prevê que até 2025 haverá 1 tonelada de plástico para cada 3 toneladas de peixe e mais plásticos do que peixes (em peso) até 2050[4], ou seja, se nada for feito, em menos de 30 anos haverá mais plástico que peixes nos oceanos.
Considerando todo esse cenário, a Diretiva (UE) n. 2019/904 objetiva justamente prevenir e reduzir o impacto dos produtos de plástico no ambiente, sobretudo no meio aquático e na saúde humana, bem como promover a transição para uma economia circular com modelos de negócio, produtos e materiais inovadores e sustentáveis, contribuindo também para o funcionamento eficiente do mercado interno europeu. Lembrando que a Diretiva também acaba impactando na produção do plástico das empresas de países terceiros que queiram comercializá-los em território europeu, uma vez que as mesmas deverão se adequar aos parâmetros exigidos pelas regras europeias.
Para alcançar os fins traçados pela normativa, a União Europeia introduz uma série de novas regras que objetivam, em parceria com os Estados-Membros:
- Proibir a colocação no mercado de produtos de plástico de utilização única em que se encontrem facilmente disponíveis alternativas adequadas e mais sustentáveis a preços acessíveis:
- A proibição é aplicável aos cotonetes, talheres (garfos, facas, colheres, pauzinhos), pratos, canudos, misturador para bebidas, varas de balões, recipientes para alimentos, bebidas e copos feitos de poliestireno expandido.
- Instituir regimes de responsabilidade alargada do produtor, com base no princípio do poluidor-pagador, para cobrir os custos necessários da gestão dos resíduos e da limpeza do lixo, bem como os custos das medidas de sensibilização destinadas a prevenir e reduzir o lixo causado por plástico de utilização única para os quais não estão facilmente disponíveis alternativas adequadas e mais sustentáveis:
- A responsabilidade alargada é aplicada aos produtores de recipientes para alimentos, ou seja, recipientes como caixas, com ou sem tampa, utilizados para conter alimentos; sacos e invólucros feitos de materiais flexíveis que contenham alimentos destinados ao consumo imediato, sem preparação suplementar; recipientes para bebidas com capacidade inferior a três litros; copos para bebidas, incluindo as suas coberturas e tampas; artes de pesca e seus componentes que contenham plástico.
- Implementar medidas de sensibilização para informar os consumidores e para incentivar um comportamento responsável dos consumidores, a fim de reduzir o lixo proveniente dos produtos listados pela diretiva:
- A rotulagem uniforme de produtos assegura que cada um dos produtos de plástico de utilização única que seja colocado no mercado ostente na sua embalagem ou no próprio produto uma marcação visível, claramente legível e indelével com informações aos consumidores sobre o seu impacto ambiental. Aqui se inserem, os tampões higiênicos, lenços humedecidos, produtos do tabaco com filtros e copos para bebidas.
- Oferecer incentivos econômicos e outros tipos de incentivos para apoiar as escolhas sustentáveis dos consumidores e promover um comportamento de consumo responsável.
- Efetuar a coleta seletiva para reciclagem de 90% das garrafas PET até 2029 e garantir que elas passem a ter na composição o mínimo de 30% de plástico reciclado até 2030.
Estas são apenas algumas das novas regras que recém entraram em vigor na União Europeia, mas que certamente demonstram que a luta contra o lixo marinho é apenas um dos componentes do panorama mundial de combate à poluição do meio ambiente e à preservação da fauna e da flora para as gerações futuras.
A mudança de paradigma na produção e consumo de produtos de plásticos deve ser compreendida tanto no contexto do compromisso regional assumido pela própria União na Estratégia Europeia para os Plásticos em 2018[5] no sentido de lidar com os resíduos e lixos plásticos prejudiciais através de uma ação legislativa direta – que culminou com a elaboração da Diretiva (UE) n. 2019/904 –, quanto numa perspectiva mais alargada de respeito e aplicação dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável traçados pelas Nações Unidas em 2015.
Todas são ações que se somam e integram-se no processo de transição para a consolidação de uma economia mais circular que invista em novas tecnologias e materiais que preservem os cidadãos e o meio ambiente, e, ao mesmo tempo, mantenham a competitividade da indústria. Afinal, uma nova economia do plástico, em que a concepção e produção de plásticos respeitem plenamente as necessidades de reutilização, reparação e reciclagem e que desenvolva e promova materiais mais sustentáveis deve ser um compromisso assumido por toda comunidade internacional.
[1] Morales-Caselles, C., Viejo, J., Martí, E. et al. An inshore–offshore sorting system revealed from global classification of ocean litter. Nature Sustainability. 4, 484–493 (2021). Disponível em: https://www.nature.com/articles/s41893-021-00720-8.pdf
[2] European Commission. Turning the tide on single-use plastics. Disponível em: https://op.europa.eu/s/pkP5
[3] Serviço de Pesquisa do Parlamento Europeu. Disponível em: https://www.europarl.europa.eu/resources/library/images/20181016PHT16220/20181016PHT16220_original.png.
[4] The News plastics economy: rethinking the future of the plastic. 2016, p. 17. Disponível em: https://www.ellenmacarthurfoundation.org/assets/downloads/EllenMacArthurFoundation_TheNewPlasticsEconomy_Pages.pdf
[5] Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões: uma Estratégia Europeia para os Plásticos na Economia Circular - COM(2018) 28 final.
*Aline Beltrame de Moura
Professora da Universidade Federal de Santa Catarina, Brasil
Coordenadora do Jean Monnet Network "Bridge Project"
Coordenadora do Jean Monnet Module CCJ/UFSC