Observatory on European Studies - A reunião internacional das partes da Convenção sobre Diversidade Biológica

2023-02-22

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Cristiane Derani*

A 15ª Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade biológica junto com a 10ª Conferência das Partes servindo como encontro das partes do Protocolo de Cartagena sobre Biossegurança e a 4ª Conferência das Partes servindo como encontro das partes do Protocolo de Nagoya sobre acesso aos recursos genéticos e distribuição justa e equitativa de benefícios oriundos do acesso – COP15- foi realizada em dois momentos.

A COP 15, como é sinteticamente referida iniciou na China em Kunming em 12 e 13 de outubro/21 e continuou no Canadá, em Montreal, entre 7 e 19 de dezembro/22. Entre a primeira e a segunda reunião, já excepcionalmente assim formatada por causa da pandemia da COVID19, essa uma consequencia da destruição maciça da biodiversidade, eventos nefastos ao ambiente se acumulam. extremos climáticos, fome, novas extinções de espécies, que se reproduzem constantemente e de modo sempre mais dramático sem, contudo, afetar nossas mentes entorpecidas que os aceitam como coisas da vida (ou da morte).

O documento central denominado Declaração de Kunming foi redigido pelo segmento de alto nível da Conferência da Biodiversidade das Nações Unidas em 2020 (part 1) com o título: “Civilização Ecológica: Construindo um futuro compartilhado com todas as vidas na Terra”. A mensagem está baseada fortemente em no princípio 1 da declaração do Rio de Janeiro, até então pouco citado nas discussões, políticas e normas internacionais, apesar de ser a essência da declaração: “Os seres humanos constituem o centro das preocupações relacionadas com o desenvolvimento sustentável. Têm direito a uma vida saudável e produtiva, em harmonia natureza”. Nesse encontro o viver em harmonia com a natureza foi alçado à diretriz para 2050.

A declaração de Kunming reconhece que existe uma interação entre as crises de perda de biodiversidade, mudanças climáticas, degradação do solo e desertificação, degradação do oceano e poluição e os crescentes riscos para a saúde humana e segurança alimentar. Ela aponta as principais causas: poluição, desmatamento e superexploração. Além disso reitera o papel dos povos indígenas e comunidades locais para a conservação e o uso sustentável da biodiversidade com seu conhecimento tradicional, inovações e práticas, refirmando seu papel de guardiões da biodiversidade sobre os seus territórios e terras.

Expressa a necessidade de uma ação urgente e integrada para uma mudança transformadora, por todos os setores da economia e todas as partes da sociedade, para criar um caminho futuro em que a biodiversidade seja conservada e utilizada de modo sustentável e os benefícios advindos da utilização dos recursos genéticos sejam divididos de modo justo e equitativo.

Por fim, a Declaração é assertiva. A proteção e conservação de 30% de área terrestre e marítima através de sistemas bem conectados e áreas protegidas e outras medidas efetivas de conservação de área devem ser alcançadas até 2030.

Estando na década da reconstituição (recovery) da biodiversidade, pelas Nações Unidas, a Declaração enumera 17 compromissos urgentes. Nessa breve notícia, são especialmente importantes os que demandam ações para reverter o corrente estado de destruição da natureza até 2030.

Outro compromisso é relativo à percepção holística da biodiversidade requerendo a integração da conservação e uso sustentável da biodiversidade nos processos decisórios.

Importante a marca que essa declaração traz para uma abordagem ecológica integrando natureza e cultura e orientando para uma abordagem ecossistêmica. Com esse tom firma o compromisso de melhorar o sistema de áreas protegidas e direitos dos povos indígenas, garantir sua participação efetiva nas políticas e assegurar a repartição justa e equitativa dos benefícios oriundos da biodiversidade.

Há uma ênfase especial a soluções com base na natureza (nature based solutions) para melhorar a saúde do planeta e dos humanos (One Health). Essa declaração foi aprovada na reunião de dezembro de 2022 e é o marco da COP15. Os demais documentos tratam de temas variados, alguns já objeto das COPs anteriores e outros inteiramente novos. Há uma compreensão clara do valor da ciência e tecnologia para o acesso aos recursos genéticos com a capacidade de gerar benefícios para a sociedade se recuperar dos desastres ambientais a que tem dado causa. Ao mesmo tempo reitera-se o valor do conhecimento tradicional e amplia-se as garantias para seu exercício e distribuição equitativa de seus benefícios.

Dentre os 25 documentos destacam-se os sobre natureza e cultura CBD/COP/15/L.10, agricultura e biodiversidade CBD/COP/15/L.16, biologia sintética CBD/COP/15/L18, sequenciamento digital de informações sobre recursos genéticos CBD/COP/15/L30.

Uma remarca importante sobre sequenciamento digital é muito importante. Seu tratamento é fundamental para que se opera a justa e equitativa repartição de benefícios. Porém para que isso ocorra é necessário criar meios de traçabilidade o que não é nada fácil. Na decisão sobre sequenciamento digital são registrados os princípios provenientes da Organização para cooperação e desenvolvimento econômico (OCDE) que devem orientar a governança das informações e que passam a informar o regime da Convenção sobre Diversidade biológica, agrupados nos acrônimos: FAIR – findable, acessible, interoperable and reusable e CARE - collective benefit, authority to control, responsibility and ethics.

Em conclusão, a COP15 mostra que os Estados partes estão bastante atentos às necessidades de se construir uma efetiva convivência entre todas as formas de vida no planeta para que a nossa espécie continue existindo. Porém ainda é duvidoso quão comprometidos os atores estão para promover as mudanças necessárias ao caminho para uma vida em harmonia com a natureza.

*Cristiane Derani

Professor of International Economic and Environmental Law at the Federal University of Santa Catarina.