Análise do posicionamento do Reino da Dinamarca frente ao Capítulo de Comércio e Desenvolvimento Sustentável (TSD) do Acordo de Associação UE-Mercosul

Robson Abraão Fonsêca Viana*

A Dinamarca é uma nação nórdica, localizada no norte da Europa, que opera sob um regime de monarquia constitucional e democracia parlamentar [1]. Sua economia se destaca pelo setor de serviços, indústrias farmacêuticas e ambientais, e agricultura altamente desenvolvida. Reconhecida por seu elevado grau de igualdade social e baixa corrupção promovido pelo estado de bem-estar social, a Dinamarca figura em 6º lugar no ranking global de prosperidade e desenvolvimento do Good Country Index [2]. O país integra as Comunidades Europeias desde 1973, antes mesmo da formação da UE, embora não faça parte da zona do euro. Vale destacar que aproximadamente ⅔ das exportações dinamarquesas são voltadas para países-membros da UE [3].

O Produto Interno Bruto (PIB) da Dinamarca em 2024 foi de aproximadamente US$ 430 bilhões [4]. O país possui uma economia altamente terceirizada (77,05% do PIB). O setor secundário contribui com 19,24% do PIB, em especial as indústrias farmacêuticas e de energias renováveis. Já o setor primário, representa somente 3,72% do PIB, embora seja bastante produtivo. A economia dinamarquesa é caracterizada por seu pequeno porte, sendo altamente dependente do comércio internacional, com as exportações e importações representando um terço do PIB. Em 2024, o intercâmbio comercial entre a Dinamarca e os países do Mercosul (Argentina, Bolívia, Brasil, Paraguai e Uruguai) atingiu aproximadamente € 1,5 – 1,6 bilhão. É digno de nota que a Bolívia, admitida ao Mercosul em 2023, encontra-se em fase de integração total, embora alguns relatórios ainda a considerem isoladamente, para os atuais propósitos, optou-se pela inclusão dos dados comerciais entre Dinamarca e Bolívia, visto que o país tende a ser um parceiro a longo prazo. Desse total, segundo o UN Comtrade, as importações representaram cerca de US$ 710 milhões (44% do volume total), enquanto as exportações contribuíram com US$ 891 milhões para a balança comercial dinamarquesa (55% do volume total) [5].

Possíveis conjunturas perante a ratificação do Acordo

O acordo Mercosul-UE promete ganhos significativos para a Dinamarca, impulsionando exportações e a criação de empregos. Atualmente, estima-se que 965 empresas dinamarquesas, sendo 78% pequenas e médias empresas (PMEs), já exportam para o Mercosul, sustentando cerca de 7.400 empregos [6]. A eliminação ou redução de tarifas e barreiras não tarifárias tende a facilitar ainda mais o acesso de produtos e serviços dinamarqueses a esse mercado, aumentando a competitividade e o volume de exportações. O acordo beneficiará diretamente setores fortes da economia dinamarquesa, especificamente farmacêuticos e de energias renováveis.

Adicionalmente, a agricultura dinamarquesa, apesar de menor no PIB, é altamente produtiva e poderá expandir suas exportações, especialmente laticínios, graças ao acesso preferencial. Por fim, os setores de tecnologia da informação e design também se beneficiarão da facilitação do comércio de serviços e do acesso a novos mercados. O fato da economia dinamarquesa ser aberta, dependente do comércio internacional, pode ser sensível a grandes mudanças comerciais. Há, também, uma certa preocupação quanto à concorrência com os produtos agrícolas sul-americanos. A percepção geral no país, no entanto, é positiva em relação às oportunidades econômicas do acordo.

O governo dinamarquês expressa forte apoio ao acordo UE-Mercosul, classificando-o como prioridade para negociação entre os Estados-Membros durante sua Presidência do Conselho da UE no segundo semestre de 2025 [7]. A iniciativa representa uma ferramenta para expandir a rede comercial da UE, fortalecer novas alianças geopolíticas e promover o desenvolvimento sustentável, além de estabelecer regras mais estáveis para comércio e investimento. Todavia, o meio ambiente e o desenvolvimento sustentável são pontos muito sensíveis, gerando preocupação na sociedade civil e entre ativistas europeus devido a danos ambientais. Apesar de a Dinamarca considerar o acordo de suma importância, o país não poupará esforços para implementá-lo com responsabilidade ambiental.

Embora a Dinamarca tenha manifestado apoio às negociações do acordo UE-Mercosul, a exemplo de uma carta enviada ao Parlamento Europeu em 2024 para apoiar as medidas, há forte oposição por parte de grupos da Esquerda Nórdica [8]. Coalizões, como os Verdes e a Esquerda, pretendem rejeitar o acordo no Parlamento Europeu e buscam ampliar sua base apoiadora. Estes grupos destacam que a principal preocupação gira em torno dos riscos ambientais e climáticos do acordo, que potencialmente intensificaria a importação de pesticidas proibidos na União Europeia (eurodeputados como Asger Christensen, Rasmus Nordqvist, Kira Marie Peter-Hansen, Villy Søvndal e Per Clausen expressaram críticas ao acordo.. Ademais, o acordo é criticado por seu potencial impacto negativo nos direitos dos trabalhadores e nas pequenas empresas em ambos os continentes, em detrimento dos interesses de grandes corporações. Outra questão levantada é a estratégia da Comissão Europeia de aprovar o acordo em partes separadas, visando contornar a votação da parte comercial nos parlamentos nacionais dos Estados-Membros [9]. Apesar de os grupos que se opõem ao acordo no PE serem minoritários, é crucial alcançar um consenso para garantir o apoio deles nas negociações.

Organizações da sociedade civil dinamarquesa e europeia, como as ONGs dinamarquesas NOAH e Verdens Skove, têm manifestado preocupações significativas sobre o acordo, especialmente quanto às cláusulas ambientais e o impacto potencial nas metas climáticas. ONGs climáticas e consumidores têm voz forte, exigindo coerência entre comércio e compromissos climáticos. Outrossim, grupos europeus em geral opõem-se ao acordo por considerarem que ele compromete a sustentabilidade, os direitos humanos e os processos democráticos. As principais preocupações incluem o impacto ambiental, a priorização dos interesses econômicos em detrimento da sustentabilidade e as questões agrícolas, como as restrições à compra de propriedades rurais por entidades não residentes na Dinamarca. Uma pesquisa recente do Eurobarômetro revela que 88% dos cidadãos europeus concordam que as importações agrícolas na UE devem seguir as normas ambientais, de bem-estar animal e trabalhistas da UE [10]. Em resumo, a pressão social é real, mas não a ponto de bloquear o acordo, a partir da ótica dinamarquesa.

Posição perante o acordo

A Dinamarca adota uma postura clara de apoio ao Acordo UE-Mercosul. O país defende que o acordo deve abranger duas dimensões: (i) pró-comércio, com apelo econômico aos ganhos para PMEs e empregos; e (ii) pró-clima, com apelo ambiental, defendendo a efetibilidade do desenvolvimento sustentável. Para o governo dinamarquês, a sustentabilidade deve ser tratada com grande responsabilidade. A posição do país ressalta compromissos com o Acordo de Paris e demais mecanismos de proteção ambiental implementados pela UE. Tal postura é defendida através da exposição de que o compromisso da Dinamarca com meio ambiente tem resultado na mobilização de recursos, a exemplo de financiamentos e parcerias milionários com o Banco Mundial.

FONTES:
[1] CAÑAVERAS PÉREZ, Germán. Dinamarca: Perfil socioeconómico. 2024.
[2] Good Country. Good Country Index. Acessado em 29 de agosto de 2025. https://index.goodcountry.org/.
[3] Dinamarca. Ministério das Relações Exteriores. “Sobre a Dinamarca: Economia e Produção.” Acessado em 5 de setembro de 2025. https://brasilien.um.dk/pt/sobre-a-dinamarca/economia-e-producao.
[4] Trading Economics. “Denmark GDP.” Acessado em 26 de agosto de 2025. https://pt.tradingeconomics.com/denmark/gdp.
[5] Nações Unidas. Comtrade Plus. Acessado em 7 de setembro de 2025. https://comtradeplus.un.org/TradeFlow?Frequency=A&Flows=all&CommodityCodes=TOTAL&Partners=all&Reporters=208&period=2024&AggregateBy=none&BreakdownMode=plus
[6] Comissão Europeia. “Relações comerciais da UE por país e região: Mercosul: Comércio Dinamarca-Mercosul na sua cidade.” Acessado em 8 de setembro de 2025. https://policy.trade.ec.europa.eu/eu-trade-relationships-country-and-region/countries-and-regions/mercosur/eu-mercosur-trade-your-town/denmark-mercosur-trade-your-town_en.
[7] Parlamento Europeu. Briefing: EU-Mercosur Agreement: Key Facts and Figures. 2025. Acessado em 1º de setembro de 2025. https://www.europarl.europa.eu/RegData/etudes/BRIE/2025/775852/EPRS_BRI(2025)775852_EN.pdf.
[8] Enhedslisten. “Nordic Left MEPs: The Mercosur Agreement Is Bad for the Environment, Workers and the Climate!” Acessado em 9 de setembro de 2025. https://enhedslisten.eu/nyheder/nordic-left-meps-the-mercosur-agreement-is-bad-for-the-environment-workers-and-the-climate/.
[9] DELEGAÇÃO DA UNIÃO EUROPEIA NO BRASIL. Comissão Europeia propõe adoção do Acordo UE-Mercosul. Acesso em: 4 set. 2025. https://www.eeas.europa.eu/delegations/brazil/comiss%C3%A3o-europeia-prop%C3%B5e-ado%C3%A7%C3%A3o-do-acordo-ue-mercosul_en?s=191.
[10] Parlamento Europeu. Eurobarometer: Plenary Insights February 2025. 2025. Acessado em 30 de agosto de 2025. https://www.europarl.europa.eu/at-your-service/files/be-heard/eurobarometer/2025/en-plenary-insights-february-2025.pdf.

*Robson Abraão Fonsêca Viana