Arnaldo Rodrigues de Araujo Junior*
A Finlândia é uma república parlamentar nórdica, com aproximadamente 5,6 milhões de habitantes e elevado índice de desenvolvimento humano. O país caracteriza-se pela estabilidade democrática, pela transparência institucional e pela forte ênfase em governança pública. Suas prioridades concentram-se em segurança, desenvolvimento sustentável, bem-estar social e inovação tecnológica [1].
Desde sua adesão à União Europeia, em 1995, o país busca promover crescimento, estabilidade e segurança no continente [2]. A Finlândia consolida-se como um membro comprometido com a integração, a sustentabilidade e a defesa da democracia, além de exercer papel ativo na promoção de direitos humanos, nas negociações ambientais e na defesa do comércio justo e sustentável.
A Finlândia possui um compromisso histórico com o desenvolvimento sustentável. Assim como os outros países nórdicos, há a preocupação internacional em se manter como liderança em transição energética e em transição verde. Ao longo dos últimos anos, o investimento em iniciativas ambientais mantém-se elevado, ainda que gastos com segurança militar tenham aumentado. Iniciativas como a Forest Strategy 2035 e a Carbon Neutral Finland são amplamente divulgadas em âmbito local em matéria de política de Estado, tal qual o financiamento do Nordic Embassy Cooperation Programme (NEP) diretamente na Amazônia [3].
Em um parecer econômico, a República da Finlândia alia economia de mercado a políticas de bem-estar social e segue um modelo multissetorial. O setor de serviços representa 61% do Produto Interno Bruto (PIB), a indústria 23% e o setor primário entre 2% e 3%. No comércio com o Mercosul, as exportações finlandesas atingem 1,1% do total, e as importações 1%, o que indica que o fluxo comercial com o bloco é limitado [4].
O Brasil é o principal parceiro regional e fornece produtos agropecuários, minerais e energéticos, enquanto outros países do Mercosul também exportam para a Finlândia. As exportações finlandesas incluem maquinário, manufaturas de alta tecnologia, equipamentos industriais e tecnologias limpas, com ênfase em eficiência energética e bioeconomia [5]. A dependência estrutural da Finlândia em relação ao bloco é baixa e reduz os riscos para setores estratégicos. Os impactos do acordo Mercosul–União Europeia incidem principalmente sobre questões ambientais e de sustentabilidade, sem afetar setores sensíveis da economia.
Apesar do volume comercial restrito, a cooperação com o Mercosul fortalece oportunidades de intercâmbio tecnológico e inovação em setores estratégicos. Nesse sentido, o acordo União Europeia-Mercosul oferece à Finlândia oportunidades positivas significativas, por facilitar a exportação de produtos industriais, como máquinas e equipamentos, e fortalecer a cooperação em inovação e energia renovável. Estima-se a geração de cerca de 13.000 empregos, sobretudo nos setores industrial e de serviços, beneficiando pequenas e médias empresas e a indústria florestal, como na exportação de papel e celulose. O setor de serviços deve expandir-se com a abertura de mercados públicos no Mercosul [6].
Entre os desafios, destacam-se impactos ambientais, especialmente o desmatamento e eventuais pressões sobre a legislação europeia, uma vez que, para a Finlândia, cuja política externa é guiada por compromissos de neutralidade climática, bioeconomia e proteção das florestas, a possibilidade de retrocessos regulatórios ameaça diretamente sua credibilidade internacional.
Ainda assim, o efeito negativo na economia local se mostra como mínimo. Apesar da existência de pressão da sociedade civil, os impactos diretos na agricultura e na silvicultura são mínimos, visto que a produção finlandesa é majoritariamente familiar, voltada ao abastecimento interno. A indústria finlandesa também pode enfrentar maior concorrência de produtos sul-americanos em mercados sensíveis, mas as estimativas oficiais do governo indicam que os ganhos serão muito superiores às perdas. Por certo, o governo da Finlândia, liderado pelo Partido da Coalizão Nacional (centro-direita), apoia o acordo UE-Mercosul[6].
No Parlamento Nacional (Eduskunta), partidos de centro e centro-direita, como o Movimento Agora, mantêm posição favorável. A oposição da direita (Partido dos Finlandeses e Aliança da Verdade) defende a soberania nacional e preocupa-se com o setor agrícola e impactos ambientais []. A oposição da esquerda (Partido Verde e Aliança da Esquerda) critica os impactos ambientais, o desmatamento na Amazônia, a concorrência desleal à produção interna e defende o cumprimento do Acordo de Paris [7].
Similarmente, no Parlamento Europeu, os eurodeputados finlandeses têm se manifestado de forma mista sobre o acordo UE-Mercosul. The Left e Verdes/ALE destacam preocupações ambientais, sociais e de direitos humanos, enquanto Renew Europe e PPE focam em harmonização regulatória e comércio, sem posição explícita de apoio ou oposição. As participações foram limitadas e ocorreram em plenários, comissões, relatórios e debates em redes sociais [8]. Há convergência parcial com o governo nacional na promoção do comércio, mas divergência sobre impactos socioambientais e reciprocidade do acordo, evidenciando equilíbrio entre parcerias comerciais e sustentabilidade.
A sociedade finlandesa apresenta opiniões divergentes sobre o acordo UE-Mercosul. Grupos empresariais, como a Confederação das Indústrias da Finlândia (EK) e o Finnish Latin American Business Council, apoiam o tratado, destacando seus benefícios comerciais. Por outro lado, ONGs e sindicatos criticam o acordo, enfatizando impactos ambientais, riscos sanitários e concorrência desigual para agricultores [9].
O clima das negociações entre a União Europeia e o Mercosul é marcado por um equilíbrio delicado entre interesses econômicos e exigências ambientais. Nesse contexto, a Finlândia se destaca como uma das vozes mais enfáticas em defesa da sustentabilidade como condição essencial para a ratificação do acordo. A postura finlandesa reflete tanto compromissos internos, como a meta de neutralidade de carbono até 2035, quanto o alinhamento com a Política Europeia do Pacto Verde (Green Deal) e o Regulamento de Cadeias Livres de Desmatamento (EUDR) [10].
A diplomacia finlandesa atua para garantir que o acordo inclua mecanismos robustos de monitoramento ambiental, cláusulas vinculantes de cumprimento do Acordo de Paris e sanções proporcionais em caso de descumprimento, buscando evitar retrocessos que possam comprometer a credibilidade ambiental da União Europeia. Assim, Helsinque adota uma estratégia que combina pragmatismo econômico e rigor ambiental, projetando-se como mediadora entre os Estados-membros mais liberais e aqueles mais cautelosos quanto à liberalização comercial. Essa posição se apoia em políticas nacionais de captura de carbono, cadeias livres de desmatamento e due diligence [11].
No âmbito das negociações comerciais entre os blocos, Helsinque busca ampliar o acesso de sua indústria, especialmente nos setores de tecnologia limpa, maquinário e produtos florestais de base circular, aos mercados sul-americanos. O objetivo é transformar a abertura comercial em vetor de competitividade, projetando a sua expertise em soluções verdes. Por isso, há a busca de um delicado equilíbrio entre a aprovação rápida do acordo, ao mesmo tempo que se busca a proteção ambiental proeminente nas relações exteriores da Finlândia [11].
Concessões possíveis se concentrarão no setor agrícola, onde a Finlândia admite flexibilidade nos critérios da Política Agrícola Comum e na adaptação de apoios em contextos de crise, desde que preservada a segurança alimentar, a continuidade da produção local em condições climáticas adversas e o cumprimento dos tratados de sustentabilidade. As particularidades produtivas do país são essenciais para a aprovação do Acordo UE-Mercosul, por alinharem política externa, prioridades da produção interna e a participação da sociedade, em uma diplomacia sólida.
A análise da posição da Finlândia diante do Acordo União Europeia–Mercosul evidencia a coerência entre sua política externa, seus compromissos ambientais e sua tradição de governança democrática [10]. Embora o país reconheça os benefícios econômicos e tecnológicos decorrentes da ampliação do comércio birregional, sua postura é marcada por um forte condicionamento ambiental, que reflete tanto a política doméstica de neutralidade climática até 2035 quanto o alinhamento às metas do Pacto Verde Europeu [3].
Desse modo, a Finlândia reafirma sua identidade como um Estado comprometido com o multilateralismo e a sustentabilidade, projetando-se como mediadora entre interesses econômicos e ambientais no cenário europeu. Sua participação nas negociações do Acordo UE–Mercosul ultrapassa a dimensão comercial e se consolida como expressão de uma diplomacia verde, orientada por princípios éticos, científicos e de longo prazo, que buscam alinhar prosperidade econômica, justiça climática e governança global.
Referências
[1] FINNISH GOVERNMENT. “Finnish Government’s EU policy objectives.” Helsinque, 2025. Disponível em: https://valtioneuvosto.fi/en/eu-policy/objectives. Acesso em: 25 ago. 2025.
[2] FINNISH GOVERNMENT. “EU Policy.” Helsinque, 2025. Disponível em: https://valtioneuvosto.fi/en/eu-policy. Acesso em: 25 ago. 2025.
[3] FINNISH GOVERNMENT. “Project: Catch the Carbon Programme and Carbon Sequestration in the Land Use Sector.” Helsinque, 2025. Disponível em: https://valtioneuvosto.fi/en/project?tunnus=MMM027:00/2022. Acesso em: 27 ago. 2025.
[4] TRADING ECONOMICS. “Finland GDP.” 2025. Disponível em: https://pt.tradingeconomics.com/finland/gdp. Acesso em: 2 set. 2025.
[5] OECD. OECD Economic Surveys: Finland 2025. Paris, 2025. Disponível em: https://www.oecd.org/en/publications/oecd-economic-surveys-finland-2025_985d0555-en.html. Acesso em: 2 set. 2025.
[6] EUROPEAN COMMISSION. “EU-Mercosur Trade: Finland.” Bruxelas, 2025. Disponível em: https://policy.trade.ec.europa.eu/eu-trade-relationships-country-and-region/countries-and-regions/mercosur/eu-mercosur-trade-your-town/finland-mercosur-trade-your-town_en#:~:text=Mercosur%20Trade%20topics-,Finland,Mercosur%20countries%20are%20not%20available. Acesso em: 9 set. 2025.
[7] EP THINK TANK. The EU-Mercosur Agreement: Current State of Play and Challenges. Bruxelas, 2024. Disponível em: https://www.europarl.europa.eu/thinktank/en/document/EPRS_BRI(2024)760334. Acesso em: 25 ago. 2025.
[8] EUROPEAN PARLIAMENT. “Debates – Tuesday, 10 February 2025.” Estrasburgo, 2025. Disponível em: https://www.europarl.europa.eu/doceo/document/CRE-10-2025-02-13-ITM-003_EN.html. Acesso em: 9 set. 2025.
[9] FINUNIONS. “Päätöksenteko Euroopan parlamentissa on entistä hajanaisempi.” Helsinque, 2025. Disponível em: https://finunions.org/paatoksenteko-euroopan-parlamentissa-on-entista-hajanaisempi/. Acesso em: 6 set. 2025.
[10] ENHEDSLISTEN. “The Nordic Social Democratic parties and the EU-Mercosur agreement: Trade union rights, climate change and a strong welfare state must come first.” 2025. Disponível em: https://www.enhedslisten.dk/nyhed/the-nordic-social-democratic-parties-and-the-eu-mercosur-agreement. Acesso em: 26 ago. 2025.
[10] FINNISH GOVERNMENT. “16 EU Member States, led by Finland: Bioeconomy must stand out at core of next Commission’s work programme.” Helsinque, 2025. Disponível em: https://valtioneuvosto.fi/en/-/1410837/16-eu-member-states-led-by-finland-bioeconomy-must-stand-out-at-core-of-next-commission-s-work-programme. Acesso em: 6 set. 2025.
[11] FINNISH MINISTRY FOR FOREIGN AFFAIRS. “Suomi muiden silmin 2025: Suomi-kuva säilyi vakaana, mutta mielikuvat maailmalla jakautuvat.” Helsinque, 2025. Disponível em: https://um.fi/press-releases/-/asset_publisher/ued5t2wDmr1C/content/suomi-muiden-silmin-2025-suomi-kuva-sailyi-vakaana-mutta-mielikuvat-maailmalla-jakautuvat/35732. Acesso em: 28 ago. 2025.
*Arnaldo Rodrigues de Araujo Junior
Graduando em Relações Internacionais pela UFRR – Universidade Federal de Roraima. ORCID: 0009-0002-9553-5448