João Pedro Fraim Monteiro*
A República Federal da Alemanha, como a maior economia da Europa e uma das vozes centrais da diplomacia internacional, reconhece que o futuro da União Europeia dependerá da capacidade do bloco de se reinventar diante das transformações globais, sem jamais renunciar aos valores consagrados no Tratado de Maastricht ligados a paz duradoura, solidariedade entre nações e prosperidade compartilhada [1].
A força produtiva da República Federal da Alemanha repousa sobre quatro pilares industriais de excelência, sendo estes os setores automotivos, de engenharia mecânica, químico e elétrico [2]. Ainda, conscientes das transformações da ordem econômica internacional, o país busca diversificar seus vínculos comerciais. À exemplo disso, a iniciativa Alemanha-América Latina e Caribe, lançada em 2019, visa fomentar a presença de empresas alemãs no Cone Sul e construir parcerias de longo prazo [3].
Sob a liderança do primeiro-ministro Friedrich Merz, eleito em fevereiro de 2025, a Alemanha considera a ratificação do Acordo Mercosul e União Europeia um posicionamento político importante, com vistas a aprofundar os laços entre regiões democráticas e defensoras de uma ordem global baseada em regras e cooperação [4].
Para a indústria alemã, o acordo cria novas oportunidades de investimento, inovação e competitividade. Do ponto de vista do consumidor, o acordo também contribui para a estabilidade econômica ao facilitar o acesso a alimentos e insumos de qualidade a preços mais acessíveis, enfrentando as pressões inflacionárias [5].
Contudo, a Alemanha reconhece que todo acordo de grande escala envolve ajustes e transições, em especial para setores sensíveis. Desta forma, entende-se que o Acordo Mercosul e União Europeia é, para o governo alemão, uma plataforma de desenvolvimento compartilhado e uma afirmação clara dos valores europeus em um mundo multipolar.
No cenário político atual, a principal força partidária no Parlamento alemão é a União Democrata Cristã (CDU), tradicionalmente comprometida com os princípios do livre comércio e cooperação internacional. É válido mencionar que este é o partido do primeiro-ministro Friedrich Merz e da presidente da Comissão Europeia Ursula Von der Leyen.
Por sua vez, o Partido Social-Democrata (SPD) é uma importante força política alemã e, ao lado da CDU, têm manifestado apoio ao Acordo entre Mercosul e União Europeia, condicionando-o, com razão, a salvaguardas em matéria ambiental e trabalhista [6].
É válido mencionar que os partidos de extrema-direita estão em ascensão na Europa. À vista disso, a Alternativa para a Alemanha (AfD) representa uma corrente nacionalista e protecionista, contrária aos pilares de integração e abertura econômica. Contudo, as eleições de fevereiro de 2025 resultaram na formação da “Grande Coalizão de Responsabilidade pela Alemanha”, unindo a CDU e o SPD em torno de um compromisso com a estabilidade democrática e cooperação política [7].
Ademais, a Alemanha é o país mais populoso da União Europeia e, por isso, representa a maior delegação no Parlamento Europeu. Apesar das críticas legítimas do Partido Verde alemão e de Organizações Não Governamentais ambientais, os grupos políticos que fazem parte da coalizão governista do chanceler Friedrich Merz, como a CDU e o SPD, expressam firme e inequívoco apoio à ratificação do Acordo entre Mercosul e União Europeia [8].
Para estes grupos políticos, mais do que um tratado comercial, este acordo simboliza a capacidade da União Europeia de agir com visão estratégica. Logo, em um contexto de crescentes tendências protecionistas, guerras tarifárias e retrocessos democráticos, a parceria se destaca como um contraponto construtivo em defesa do diálogo político.
Como em qualquer grande decisão política, o debate público sobre o Acordo entre Mercosul e União Europeia reflete a diversidade de interesses presentes na sociedade alemã. No atual cenário, representantes da indústria, câmaras de comércio e o governo defendem a ratificação do acordo [9]. Por outro lado, Organizações Não Governamentais ambientais, associações de agricultores e sindicatos manifestam ressalvas legítimas, trazendo à tona preocupações sobre a proteção dos direitos sociais e a concorrência com produtores locais [10].
Desta forma, os representantes do governo alemão, reafirmam o compromisso com o diálogo democrático e a escuta atenta a todas as vozes da sociedade civil. O primeiro-ministro Friedrich Merz trabalha pela ratificação de um acordo que não apenas impulsione o comércio e a cooperação internacional, mas que também reflita os mais altos padrões de sustentabilidade e proteção social.
Por isso, a estratégia alemã de intervenção em favor do Acordo entre Mercosul e União Europeia parte do reconhecimento de seu profundo simbolismo histórico. Ao combinar um PIB superior a 22 trilhões de dólares e uma população de mais de 700 milhões de pessoas, o acordo representa a maior e mais significativa parceria comercial da história contemporânea [11].
A nível econômico, o pacto amplia o acesso dos setores produtivos alemães a insumos críticos, fortalecendo a segurança alimentar e oferecendo novas oportunidades comerciais a setores estratégicos.
[1] Parlamento europeu. Tratado de Maastricht, 29 jul. 1992. https://www.europarl.europa.eu/factsheets/pt/sheet/3/os-tratados-de-maastricht-e-de-amesterdao.
[2] Deutschland. A Alemanha como um país industrializado, 27 mar. 2025. https://www.deutschland.de/pt-br/topic/economia/a-industria-alema-os-mais-importantes-dados-e-fatos.
[3] Representação da república federal da Alemanha no Brasil. Discurso de abertura do Ministro das Relações Externas, Heiko Maas, na Conferência da América Latina e do Caribe, 31 mai. 2019. https://brasil.diplo.de/br-pt/noticias/klimaschutz-brasilien-buergermeisterinnen-2167328. [4] Deutsche welle. Novo líder alemão defende ratificação do acordo Mercosul-UE, 7 mai. 2025. https://www.dw.com/pt-br/novo-l%C3%ADder-alem%C3%A3o-defende-ratifica%C3%A7%C3%A3o-de-acordo-mercosul-ue/a-72464694.
[5] Conselho da união europeia. UE-Mercosul: um impulso para empregos e exportações na Alemanha. https://policy.trade.ec.europa.eu/eu-trade-relationships-country-and-region/countries-and-regions/mercosur/eu-mercosur-trade-your-town/germany-mercosur-trade-your-town_en.
[6] BBC. Cinco principais conclusões das eleições alemãs, 24 fev. 2025. https://www.bbc.com/news/articles/cx29wlje6dno.
[7] Deutschland. CDU, CSU and SPD sign coalition agreement, 6 mai. 2025. https://www.deutschland.de/en/videos/cdu-csu-and-spd-sign-coalition-agreement.
[8] Reuters. Merz da Alemanha: Progresso no acordo comercial UE-Mercosul fortalece as economias da Alemanha e da UE, 3 set. 2025. https://www.tradingview.com/news/reuters.com,2025:newsml_S8N3RN0A5:0-germany-s-merz-progress-on-eu-mercosur-trade-deal-strengthens-german-eu-economies/.
[9] Conselho da União Europeia. UE-Mercosul: um impulso para empregos e exportações na Alemanha. https://policy.trade.ec.europa.eu/eu-trade-relationships-country-and-region/countries-and-regions/mercosur/eu-mercosur-trade-your-town/germany-mercosur-trade-your-town_en.
[10] Deutsche Welle. O Acordo comercial UE-Mercosul irrita agricultores e ambientalistas, 9 ABR. 2025. https://www.dw.com/en/eu-mercosur-trade-deal-angers-farmers-environmentalists/a-73880624.
[11] Comissão europeia. UE e Mercosul chegam a acordo político para parceria inovadora. https://ec.europa.eu/commission/presscorner/detail/en/ip_24_6244.
*João Pedro Fraim Monteiro
Graduando em Relações Internacionais na Universidade de Brasília.